3. mineirizando

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27/12/2008, sábado tempestuoso.


acordamos bem cedo para seguir caminho. algo dificultava de antemão: muita chuva. não estávamos devidamente preparados. primeiro furo. modesto café com pão na pequena sala-de-estar de Dalva. um senhor dizia que não pararia tão cedo, e que se ali chovia, na serra estava bem pior. talvez não valesse a pena. impasse esperando o tempo melhorar. saí para comprar uma capa. arranjei uma de pescador. rapidamente, nos percebiam estrangeiros pelo comércio.


improviso.

ajeitamos as coisas de modo que os mochilões ficassem protegidos com um tipo papel laminado, que compramos antes de ir, e o violão coberto por um saco de lixo preto, com um rasgo apenas para segurar a alça. as mochilas menores botamos por baixo da capa. longa espera. ainda garoando, seguimos em direção à saída.


esperar pensando.

poucas pessoas na rua. chuva e sábado. chegamos num posto de gasolina ainda dentro da cidade. todos afirmavam que quem passasse por ali seguiria à São roque de Minas. espera e espera. duramos a tarde inteira conversando com os frentistas. nos riram de piada.


cão.

um taxista ofereceu um preço salgado. negamos. uma moça que ia para uma cidade mais longe nos alertou que precisávamos fazer um roteiro. última tentativa foi andar 2 Km na garoa até a saída da cidade. mas já era tarde. nada de carona. ficamos pouco e decidimos voltar à pensão estelar. no dia seguinte, iríamos de qualquer jeito.

noite com sopa de fogareiro. violão.

e sono.



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28/12/2008, domingo cedo goteira logo boceja.


cedo que só galo, caminhamos à saída de Piuhmi. desacostumados com a bagagem. o peso pungia. acenamos ainda andando.


o cão e nós.


e um súbito. Elifas é o nome do mineiro da carona. odeia flamenguista. viajava sozinho havia 4 horas. vinha de São Paulo. trabalha lá, mas é de Vargem Bonita-MG. pacato vilarejo entre Piuhmi e São Roque de Minas. pra lá fomos rasgando o sereno. contou da pequena rivalidade entre as cidades. sem querer, atropelamos uma rolinha voadora. a estrada passeava fazendas. tentou nos convencer a ficar por ali mesmo e ofereceu a casa dos pais, onde ia passar o ano novo. queríamos presenciar a nascente do Rio São Francisco na Serra da Canastra e negamos agradecidos.


eu e geraldo, contador de causos.


Vargem Bonita não foge ao nome. acompanhamos um bocejar montanhoso. úmido pra desenho. nada acontecia que não fosse de apreciação e bem-estar. primeiro acaso de rota.

meia hora de violão e descompromisso Geraldo atravessou a rua. perguntei-lhe sobre carona. prosa fluiu à toa. contou sobre uma família que arrecadava roupas e brinquedos e enviava a pessoas carentes no nordeste. olhamos o mapa rodoviário. falamos do Brasil. em poucas semanas partiria em direção a Salvador. ofereceu o fogão da casa para cozinharmos. mostrou um afluente do São Francisco ali do próprio quintal. saiu para cortar o cabelo com o pastor da paróquia. voltaria logo mais.


celebrando manga doce.

Emanuel nos serviu água à la graça e quase nos convenceu a caminhar 1 hora até São Roque de Minnas por uma estrada de barro alternativa. fez companhia na rua. ofereceu manga do pé. estuda em campinas. adora água de rio e nunca viu o mar.

mais pela tarde, caminhei pelo vilarejo à procura de um salgado. rondava tudo uma praça. lugar bastante agradável. quando voltei, um menino bem guri tocava Roberto Carlos em meu violão. Pedrinho fotografou.


são tantas emoções.


3ª carona também súbita, enquanto conversávamos com Emanuel. casal em estilo lua-de-mel Simone e Inael. o maridão quis tirar um sarro. perguntou se tomávamos banho. se éramos amigos ou namorados. se tínhamos dinheiro ou não, avaliando pela universidade que estudamos. visivelmente, sua mulher se envergonhava com a pentelhação. arrastando na esportiva e conversando, chegamos vivos em São Roque de Minas-MG. e ainda agradecemos, educados que somos.


cidade baixa.


A cidade é na serra mesmo. enladeirada com bonitas pedras e paralelepípedos pelo chão. clima bem ameno de final de domingo. mais colorida e enfeitada que Vargem Bonita, no entanto mais turística. não tão acolhedora.


dona Joana, simples como natureza.


rondamos e encontramos a pensão de Joana por R$ 10 com café da manhã. e vários pães e cafés esporádicos que ela oferecia. coração bom. sozinha. orgulhou sua horta de fundos. contou de uns hippies argentinos que uma vez chegaram lá de bicicleta e se hospedaram por 15 dias.

cerveja no posto ao lado. compramos uma cachaça da serra, diretamente do alambique. seria o brinde do ano novo.


janela pra poesia.


escureceu. hora do preparo. cozinha da senhora sem geladeira, pia e lixo. jantar feliz até um rato passar pela mesa de trás. no banho, mosca e aranha disputavam território. muitos seres ali habitavam.



cozinha e banheiro de "blair".


achei engraçada demais toda aquela situação empoeirada. seria só aquela noite. a viagem já nos atravessava.


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abro a Deus
um instante de ópera
mas
surdo mudo
invento
a máquina
que o tempo
espera
arrastar.

28/12/2008


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